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A polícia que tortura e mata: A emboscada e os métodos utilizados pelos assassinos de cinco jovens

emboscada-01-ie A polícia que tortura e mata: A emboscada e os métodos utilizados pelos assassinos de cinco jovens

Uma mensagem de áudio enviada pelo celular do adolescente Jonathan Moreira, 18 anos, revela uma suposta abordagem policial a um grupo de amigos que participaria de uma festa com mulheres organizada pelas redes sociais. Horas depois, um Santana 1987 com cinco rapazes com idades entre 16 e 30 anos, Jonathan entre eles, desaparece. Após 16 dias, o veículo é achado às margens do rodoanel Mário Covas, em São Paulo. Os corpos, encontrados no domingo 6, em estado avançado de decomposição, indicam uma ação semelhante às que normalmente são praticadas por grupos de extermínio. Um dos garotos tinha as mãos amarradas e algemadas, outro estava com a cabeça decapitada, todos possuíam marcas de tiros no tórax e estavam cobertos com terra e cal próximos a estrada do Taquarassu, em Mogi das Cruzes. Além disso, cartuchos de pistola calibre .40, de uso restrito de policiais, foram localizados num terreno próximo. E mais: registros mostram que agentes da corporação consultaram dados de dois dos cinco jovens. “Não dá para negar que houve execução”, afirmou Júlio César Fernandes Neves, ouvidor das polícias de São Paulo. A sofisticação usada pelos autores do crime – que vai da atração dos garotos à festa até a forma com que foram mortos – permite dizer que os assassinatos foram orquestrados por um grupo que agiu de forma organizada, rebuscada e cruel. “Trata-se de uma chacina e o nosso medo é que continue com a autoria desconhecida”, diz.

Apesar de a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo negar a existência de provas que indiquem o envolvimento de policiais nas mortes, um garoto de 13 anos, parente de um dos jovens mortos, afirmou ter sido ameaçado por policiais durante quatro horas. Na segunda-feira 7, eles teriam circulado pelo bairro em que as vítimas moravam, Jardim Rodolfo Pirani, e encostado um revólver na cintura do adolescente. Dois policiais faziam uma varredura de celulares pelas ruas, em busca do áudio gravado por Jonathan. O jovem teve seu aparelho confiscado e quando os policiais viram fotos de um dos mortos conduziram o menino até uma viela do bairro – até que uma tia interrompeu a abordagem. Segundo o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), as intimações são suficientes para configurar assédio às famílias. Os familiares de Jones Ferreira Januário, 30 anos, César Augusto Gomes, 19 anos, Caíque Machado, 18 anos, Robson de Paula, 16 anos e Jonathan temem se tornarem alvo de represália. “Existem sinais da atuação de um grupo de extermínio agindo à revelia do comando da polícia”, afirma Ariel de Castro Alves, advogado e membro do Condepe.

Um dos fatores que favorece a formação desses grupos é a impunidade em casos de violência policial. Dados do 10º Anuário Brasileiro de Segurança Pública revelam que pelo menos nove pessoas foram mortas a cada dia por policiais em 2015. São Paulo aparece na liderança dessa estatística, com 848 vítimas. No mesmo ano, apenas 124 policiais foram recolhidos para o presídio militar Romão Gomes. Destes, 34 por homicídio. “Mesmo nos casos em que há participação de policiais comprovada, eles não são punidos”, afirma Alves. Esse tipo de crime mostra que há autorização para o uso de práticas violentas dentro das instituições. “Existe um resquício do período ditatorial que permite que forças marginais ajam dentro do poder”, diz o ouvidor Neves. Para ele, a recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que determinou a anulação da condenação dos 74 policiais militares acusados pela morte dos detentos do presídio do Carandiru é um exemplo que incita a ação de grupos criminosos.

Os corpos de Caíque e César foram reconhecidos por impressões digitais. Jonathan, por meio de arcadas dentárias. O cadeirante Robson foi identificado pelo Instituto Médico Legal (IML). Em 2014, ele foi baleado por PMs e ficou paraplégico. Os jovens tinham em comum a vida pobre na periferia e a passagem pela polícia. No bairro em que viviam, a violência faz parte da rotina dos moradores. “A sociedade aprova esse tipo de comportamento porque não acredita na justiça comum”, afirma Rafael Alcadipani, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “Surge a vontade de fazer justiça com as próprias mãos. Se não é réu primário, parece que se tem licença para matar.” Apenas Jones, o mais velho, não havia cometido nenhum delito. “Percebi que ele estava sumido quando os parentes dos garotos chegaram em casa para começarmos a busca”, diz a esposa Eliane Souza.

O caso é investigado pelo Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), com um inquérito instaurado pela Corregedoria da Polícia Militar. O ouvidor das polícias de São Paulo reconhece que são poucos os casos de policiais julgados em São Paulo. “Ainda mais raros aqueles que se tornam réus e são condenados”, diz. A impunidade dá o aval para aqueles que agem apenas puxando o gatilho de uma arma. “Há uma cultura de leniência com as execuções. Quando existem indícios da participação de agentes de segurança, acontece o acobertamento ou o abandono das investigações”, afirma Átila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional.

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