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‘Não sou bandido e tenho direito de recomeçar a vida’, diz Bruno

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Em liberdade desde o último dia 24 após passar quase sete anos preso em razão do assassinato de sua ex-amante, Eliza Samudio, o goleiro Bruno, 32, afirmou que não é bandido, como muitas pessoas o julgam, e que merece uma segunda chance.

Condenado a 22 anos e três meses pela morte de Eliza, Bruno aguarda em liberdade enquanto o recurso contra sua condenação não é julgado em segunda instância.

Ele foi libertado após decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello.

O goleiro foi entrevistado pela Folha em um hotel em Varginha, onde seu novo clube, o Boa, fica concentrado.

Assim como ocorreu em sua apresentação, um dia antes, o clube tentou impedir perguntas sobre o crime. Questionado pela Folha, porém, ele se esquivou na maioria das respostas. Falou sobre a época em que foi preso e sobre a vida de detento.

Ele afirmou também que deseja se reaproximar do filho Bruninho, fruto da relação extraconjugal com Eliza. Hoje, a criança vive com a avó materna, Sônia Moura.

“Na primeira oportunidade que tiver quero encontrar o Bruninho. É o maior desafio da minha vida. Quero me aproximar dele, filho é para sempre. É um pedacinho da gente.”, disse Bruno, que tem outras duas filhas Bruna Vitória, 11, e Maria Eduarda, 9.

Adriano Vizoni/Folhapress
17074407 'Não sou bandido e tenho direito de recomeçar a vida', diz Bruno
Goleiro Bruno durante entrevista

Folha – Você acredita que merece outra chance no futebol?
Bruno – Todas as pessoas merecem uma segunda chance, o direito de recomeçar. Não é porque uma pessoa caiu que tem que ficar no buraco. Ela tem que pegar o que fez de errado, aprender, e se tornar uma pessoa melhor. As pessoas tentaram enterrar o meu sonho em um erro que talvez eu tenha cometido. Erros acontecem na vida, principalmente quando você está perto de certas pessoas e o dinheiro e a fama te cegam. Teve uma época na minha vida que eu joguei a toalha, mas pessoas que estavam próximas de mim, como a minha mulher, a Ingrid [Calheiros, 30], nunca concordaram com isso. A pessoa que sai do mundo onde eu estava e pede oportunidade é para não se tornar bandido. Não sou bandido.

Você assume que cometeu um erro? Qual foi o esse erro?
Não sei. A Justiça acha que sim. Eu não sei. Acho que não.

Por que você não responde perguntas sobre seu passado?
Acredito que não tem o que falar. O que passou, passou.

Você se arrepende do que aconteceu na sua vida?
Quando as coisas têm que acontecer, acontecem. Não cai uma folha da árvore se Deus não permitir. Tudo o que aconteceu, para mim, é uma oportunidade para me tornar uma pessoa melhor. Se fosse possível examinar um homem por dentro certamente ninguém se diria inocente. Quem somos nós para julgar os outros? Por que as pessoas falam que o Bruno não pode? Todos nós merecemos uma segunda chance, uma terceira, uma quarta… Você não é bandido, mas terá que arcar com esse erro.

Da mesma forma que a Justiça foi feita contra mim, uma hora tem que ser feita a meu favor. A gente tem que falar de mais amor para as pessoas. Sei que Deus vai me colocar no lugar que tiver.

Como você encara a possibilidade de voltar para a prisão?
Quando Deus está à frente tudo pode acontecer.

Como foi o período em que ficou preso? Você treinava?
A Apac [Associação de Proteção e Assistência a Condenados, espécie de “presídio modelo”, em que Bruno estava antes de ser libertado] é o tipo de lugar que funciona. Quem está lá é porque tem o objetivo de mudar de vida. Lá eu fazia treinos físicos, me ajudou a me levantar. Com o passar do tempo, eu vi que o pessoal [outros presos] precisava perder peso. Perguntei para o Humberto Andrade [diretor da Apac] se ele poderia me dar um espaço para realizar treinos físicos para a rapaziada. Foi permitido desde que fosse no meu horário de folga. Eu tinha duas horas por dia e fazia isso. Não fazia treinos específicos para goleiros porque não tinha a estrutura necessária. Cheguei a tentar improvisar, mas era difícil.

Já no presídio convencional você deixa de se ressocializar porque fica revoltado. A família passa por constrangimento, se afasta e onde o preso vai buscar apoio? Ele busca no outro. O presídio convencional é uma faculdade para o crime. Quando estava lá, a sociedade estava me perdendo para o crime. Propostas de vender drogas, colocar coisas em algum lugar, não me faltaram, mas eu não queria isso para mim.

Em que você pensava no período em que ficou preso?
Aprendi muito, sofri muito e minha família também sofreu muito. É um aprendizado. Foi sofrido, foi doído, mas para mim valeu a pena porque me tornei uma pessoa bem melhor. Hoje, não traio a minha esposa, dou valor à minha mãe. Antes eu dava o dinheiro e achava que era o suficiente, e não é isso. Essas pessoas valorizam muito mais um abraço, uma rosa. Hoje, tenho consciência disso.

Como pretende recomeçar a vida fora das quatro linhas?
É realmente um recomeço. Perdi tudo, até financeiramente. Não tenho nada hoje, com exceção da minha esposa e dos meus familiares. Não todos, mas alguns. Hoje, vejo que o importante não é quantidade e, sim qualidade. Confio no meu potencial, na minha qualidade. Deus está em primeiro lugar na minha vida. O melhor ainda está por vir.

Eu tinha jogado a toalha [sobre a carreira no futebol], tinha até colocado na minha cabeça que voltaria a estudar. Queria cursar educação física, mas minha mulher disse que eu tinha que voltar independentemente do que as pessoas comentassem, que eu tinha que encerrar minha carreira de uma forma digna.

O que você espera do futuro?
Quero ser feliz. Fui feliz em uma época da minha vida, mas não sabia vivê-la. Depois foi uma época muito triste, por tudo o que aconteceu. Agora é ser feliz de verdade. Valorizar a liberdade, valorizar um copo de água gelado, valorizar um prato de comida. Levar a esposa e os filhos para passear, pegá-los no colo e abraçar, levar no parque para curtir a vida. Não é necessário muito. Na primeira oportunidade que tiver quero encontrar o Bruninho [seu filho com Eliza Samudio]. É o maior desafio da minha vida. Quero me aproximar dele, filho é para sempre. É um pedacinho da gente.

Quero também cursar educação física. O jogador tem a carreira curta. Deus está me dando a oportunidade de voltar a jogar. Daqui a três, quatro anos, não sei se terei condições de continuar. Tenho que me preparar, porque só sei jogar futebol.

Você considera que foi feliz quando jogava no Flamengo, em 2010, antes de ser preso?
Eu achava que era, mas talvez não fosse. É uma coisa muito louca você ter fama, dinheiro, mulheres… Eu vivia a vida. Não tinha compromisso com nada, era irresponsável, rasgava muita coisa. Foi preciso perder tudo para dar valor. É preciso valorizar os pequenos detalhes que fazem a diferença na sua vida.

Como controlar a ansiedade para voltar a jogar e como você está fisicamente?
Se não acontecer nenhum imprevisto, quero estar à disposição do treinador [Julinho Carmargo] em 40 ou 50 dias. O Boa tem dois goleiros jovens e chego para ajudar no que for preciso. Vou treinar para jogar. A ansiedade pode atrapalhar porque você quer atropelar as coisas. Uma coisa que aprendi na vida é ter paciência. O clube me deu todo o apoio para eu jogar quando estiver totalmente pronto. Tenho que saber trabalhar com o tempo. O corpo, a mente pode estar falando para você que você pode voltar, mas não podemos agir com emoção. Tem que agir com a razão, ser racional. Se eu voltar antes, posso sofrer uma lesão ou falhar em um lance. Tudo para o Bruno aqui no Boa Esporte vai ser maior, vai ter uma repercussão maior. Sei que o Boa vai ter uma visibilidade maior.

Por enquanto, os treinos são leves. Não estou sentindo dor, mas a maratona de treinos ainda vai começar. Para mim está sendo tudo muito novo. Estou bem tranquilo, sem dor muscular. Estou sentindo falta até delas.

O Pipoco

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