Para compensar baixa natalidade Chile precisa de migração, diz diretor
O Chile precisa de imigrantes para ocupar postos de trabalho e até vagas em escolas infantis ociosas devido à baixa taxa de natalidade no país, afirma o diretor-geral de Assuntos Consulares e de Imigração do governo.
Em visita recente a São Paulo, Raúl Sanhueza defendeu a reforma migratória que está em discussão no Congresso e negou que a proposta tenha a intenção de barrar imigrantes, como dizem críticos.
Falou ainda sobre o visto especial para venezuelanos criado em abril e revelou que o governo estuda aceitar passaportes vencidos desses imigrantes.
A reforma, apresentada pelo presidente Sebastián Piñera, substitui uma lei de 1975. Até agora, era possível entrar no país com visto de turista e lá pedir a residência. Com a mudança, os trâmites para residência terão que ocorrer antes de chegar ao Chile.
O projeto foi apresentado em meio ao forte aumento da migração. Em quatro anos, o número de estrangeiros no Chile mais do que dobrou, chegando a 1,2 milhão —o país tem 18 milhões de habitantes.
A nova lei precisa ser aprovada pelo Congresso, mas algumas medidas já estão em vigor, como o visto para venezuelanos, que tem que ser pedido aos consulados do Chile dentro da Venezuela, e a regularização de estrangeiros sem documentos que já vivem no país —dos 300 mil que estão nessa situação, 200 mil já participaram, afirma o diretor.
Até agora, os imigrantes podiam pedir a residência no Chile já estando no país. Por que decidiram mudar?
A lei era muito antiga, e tivemos uma onda migratória muito grande. De cada quatro imigrantes que vivem no Chile, três entraram nos últimos quatro anos. O que estamos tentando fazer é que as pessoas entrem cumprindo os requisitos.
No Chile, temos um sistema único de documentação, um só número que serve para tudo: identidade, serviço militar, carteira de motorista, passaporte, previdência. Isso é ótimo para os que estamos dentro, mas, se você não tem esse número, não pode fazer nada: trabalhar, alugar casa, ter conta em banco.
Quem entrava como turista demorava oito ou nove meses para receber o número. O propósito da reforma é que o imigrante receba esse número rapidamente, em duas semanas, desde que já declare que quer morar no Chile antes de chegar. Sem o documento, a pessoa ficava um longo tempo em situação de vulnerabilidade.
A reforma dificulta a ida de imigrantes ao país?
Não se trata de fechar o país, mas de organizar. Até porque temos um problema demográfico importante: não estamos repondo a população, portanto, precisamos do imigrante. A taxa de reposição populacional deve ser de 2,1 filhos por mulher, enquanto a nossa é de 1,2.
Por isso, a chegada dos imigrantes não sobrecarregou o sistema escolar. As crianças estrangeiras ocupam vagas que estavam ociosas. Há colégios com 60% a 70% de alunos imigrantes. A educação pública sobrevive por causa deles. Se não fosse isso, teríamos que fechar escolas.
E temos áreas da economia que funcionam graças aos imigrantes, como a agricultura. Em algumas cidades do interior, a saúde pública só funciona por causa dos médicos estrangeiros.
Temos um problema de falta de mão de obra qualificada e não qualificada. E a única forma de de repor isso é pela imigração.
O Chile colocou barreiras à entrada de venezuelanos?
Pelo contrário. O visto de responsabilidade democrática é extraordinariamente fácil de obter. Se outro estrangeiro quer vir para o Chile, tem que apresentar certificado de saúde e de suficiência econômica. Dos venezuelanos só exigimos certificado de antecedentes penais.
Mas exige-se passaporte válido por 18 meses, quando muitos venezuelanos têm dificuldade de obter o documento.
Reduzimos esse tempo, agora a validade precisa ser de 12 meses. E agora estamos estudando o tema dos passaportes vencidos. Temos que ver como faremos do ponto de vista técnico, mas a vontade política existe.
O número de venezuelanos entrando no Chile diminuiu com o novo visto?
O objetivo não é que diminua. Queremos que venham todos os venezuelanos que desejem, mas que entrem ordenadamente e possam obter seus documentos rápido.
Foram cerca de 12 mil [desde a mudança]. Devemos terminar o ano com a Venezuela sendo o primeiro país de origem dos imigrantes no Chile. Até dezembro, estimamos que 200 mil vivam no país.
Quanto tempo leva para que um venezuelano consiga o novo visto?
Ao redor de um mês e meio. Mas é uma questão física. Aumentamos nosso pessoal nos consulados Caracas e Puerto Ordaz, mas não conseguimos emitir mais do que 100, 200 vistos por dia.
Em Roraima, houve alguns ataques xenofóbicos contra venezuelanos. O Chile teve problemas parecidos?
Não acredito que os brasileiros, que são um país de imigrantes, sejam xenófobos. Acho que estão incomodados por causa do impacto numérico.
Uma comunidade de acolhida tem direito de não ter sua vida afetada pela chegada massiva de pessoas. Pensar que há xenofobia é pensar que há uma ideologia por trás.
No Chile, é a mesma coisa. O impacto maior é nos sistemas de saúde, já sobrecarregados por causa do envelhecimento da população.
O número de brasileiros no Chile tem aumentado?
Temos 10 mil a 15 mil brasileiros morando no Chile, muitos devido a casamentos mistos ou funções empresariais. Mas vemos dois fenômenos interessantes.
Um é o aumento do número de estudantes e outro, de turistas. Inclusive estão sendo lançados novos voos. Todos os anos, de 300 a 400 mil brasileiros vão ao Chile de férias.