Reforma administrativa mira em romper privilégios e manter capacidades do Estado, dizem especialistas
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O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), vem defendendo que volte a tramitar na Casa a reforma administrativa. A matéria está contida na proposta de emenda à Constituição 32 de 2020, que — segundo o parlamentar — está pronta para ir ao plenário.
Especialistas consultados pela CNN indicam que um dos principais pontos positivos da PEC 32 é romper privilégios do funcionalismo. Para Luciano Nakabashi, professor da FEA-RP, da USP, esse é um dos fatores que faz da reforma “necessária”.
“É preciso acabar com certos privilégios. É positivo, por exemplo, limitar férias a 30 dias, dar fim dos aumentos salariais por tempo, sem avaliação. Quando a gente olha esses benefícios, percebemos que há alguns excessos”, indica.
Além de férias superiores a 30 dias e adicionais por tempo de serviço, a reforma administrativa também acaba com benefícios como licença-prêmio e outras por tempo de serviço; adicionais por substituição; aumentos de remuneração ou indenização com efeitos retroativos; aposentadoria como punição; entre outros.
Segundo Alketa Peci, professora da FGV Ebape, a PEC 32 falha, contudo, ao preservar benefícios de juízes e promotores. O texto mantém, por exemplo, as férias de 60 dias. A especialista destaca que há dentro do funcionalismo “desigualdade entre carreiras”.
“A reforma falha ao não incluir o Judiciário, ao não incluir o setor onde há as maiores disfunções do setor público. Assim, ela [reforma] perde legitimidade”, aponta.
Professor da Fundação Dom Cabral na área de gestão pública, Humberto Falcão indica, por outro lado, que o fato de este texto ter “nascido” com motivação fiscal é uma inadequação. Para o doutor, uma reforma administrativa deve buscar fortalecer as capacidades do Estado para solução de problemas públicos.
“Não dá para pensar em uma reforma que vai tornar o Estado menos capaz. O propósito da reforma deveria ser melhorar as capacidades do setor público, para que ele funcione melhor — não em uma linha que advoga equivocadamente que o setor público é excessivamente grande e deveria ser enxugado”.
Vale destacar que o relatório do deputado Arthur Maia (União-BA) garante todos os direitos adquiridos dos servidores atuais. As mudanç
as de regra se aplicariam somente àqueles que ingressarem no setor público após a aprovação da PEC.
Desempenho de servidores
Um dos pontos mais polêmicos da reforma são as mudanças para regras de estabilidade. O texto, por exemplo, facilita a abertura de processos administrativos para perda de cargo de servidores com avaliação de desempenho insatisfatório.
Nakabashi indica que são necessárias intervenções nas regras de estabilidade, mas observa que a reforma “usa chicote sem oferecer cenouras”. Ele indica, por exemplo, que a isonomia salarial, que varia somente de acordo com o tempo de serviço, tende a desestimular funcionários de melhor desempenho.
“Não é necessária uma estabilidade tão forte como há hoje. Mas a avaliação tem que servir para outras coisas também, como beneficiar os servidores que são bem avaliados. Você não pode só tirar”, aponta.
Humberto Falcão aponta a importância de avaliações relativas ao desempenho, mas acredita que a reforma “exagerou” na constitucionalização. Ele acha que parte dessas medidas que dizem respeito ao “RH do governo” poderiam ter forma infraconstitucional.
O especialista elenca três disfuncionalidades essenciais: um processo falho de seleção de lideranças; ineficiente observação de vocações para membros do funcionalismo em concursos públicos; e também ineficiente avaliação de desempenho e monitoramento dos serviços prestados.
“Com a alavancagem destes três fatores, o ganho de eficiência para o serviço público seria muito grande — mesmo sem mexer em pontos críticos e de difícil tramitação”, indica Falcão.
A professora Alketa Peci reitera a necessidade de incrementar o modelo atual de concurso público. Ela defende que este processo se torne mais “meritocrático”. Ainda destaca fragilidades de processos simplificados, como para contratações temporárias — cujas regras são flexibilizadas pela PEC.
Parcerias com o privado
O relatório de Arthur Maia também traz instrumentos para cooperação com empresas privadas. De acordo com a proposta, a cooperação com órgãos e entidades públicos e privados pode compartilhar a estrutura física e utilizar recursos humanos de particulares, com ou sem contrapartida financeira.
Alketa Peci diz que esta é uma “questão superada”, visto que essa cooperação entre público e privado já é realidade em diversos entes. Nakabashi vê a possibilidade como positiva.
“A gente vê lá fora [do país] que esta questão, principalmente quando a gente pensa em universidade, instituto de pesquisa, essa parceria com o setor privado é até uma forma de capitalização, de arrumar recursos de financiamento”, diz o professor da USP.
CNN