Lula e FHC assinam nota conjunta em defesa da Argentina e contra proposta de Paulo Guedes para o Mercosul
Os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso estão juntos outra vez. Agora, em defesa do presidente argentino, Alberto Fernández, que resiste às pressões do governo brasileiro para reduzir de maneira drástica a Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul, usada pelo bloco para importações de terceiros países.
Quase um mês após se reunirem na casa do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Nelson Jobim para discutir o estado da democracia brasileira, os dois ex-presidentes soltaram uma nota conjunta em apoio ao país vizinho e contra proposta do ministro brasileiro Paulo Guedes. “Este não é o momento para reduções tarifárias unilaterais por parte do Mercosul, sem nenhum benefício em favor das exportações do bloco”, afirma a nota.
Como revelou O GLOBO na semana passada, o embaixador argentino no Brasil, Daniel Scioli, dedicou as últimas semanas a recolher apoio à posição argentina na disputa, incluindo em sua agenda encontros com os ex-presidentes Lula, Fernando Henrique e José Sarney.
O que está em jogo é uma decisão a ser tomada na próxima reunião de ministros da Economia e Relações Exteriores do Mercosul. O encontro deveria ocorrer em 8 de junho, a próxima terça-feira, mas foi adiado por falta de acordo e ainda não tem data para acontecer.
O ministro Paulo Guedes defende uma redução linear imediata de 10% da TEC, que hoje é em média de 11,7%, e outro corte de 10% no fim do ano. Fernández, no entanto, insiste em que a redução da tarifa seja inferior ao percentual sugerido pelo governo brasileiro e que incida somente sobre bens intermediários, e não sobre produtos finais.
Segundo Buenos Aires, as propostas de Guedes poriam em risco a indústria argentina, uma vez que uma redução muito grande da TEC acirraria a competição entre as importações e a produção local e poria em risco as exportações argentinas para o Brasil, no momento em que economia do país começa a se recuperar de três anos de recessão, aprofundada pela pandemia. O governo brasileiro, por sua vez, acusa o país vizinho de protecionismo.
Na semana passada, o governo argentino fez uma nova proposta sobre a reforma da TEC: o país aceitaria que o Brasil faça uma redução de 10% da tarifa agora e se comprometeria a baixar 10% da TEC de 75% de suas posições tarifárias em janeiro de 2022. Mas a proposta não fala num segundo corte de 10% neste ano, algo considerado essencial pela equipe econômica brasileira.
Além disso, há a questão da revisão do Tratado de Assunção, que marcou o nascimento do Mercosul em 1991. O governo Bolsonaro defende há tempos uma mudança para que cada país possa assinar acordos comerciais com terceiros países individualmente. Argentina e Paraguai são contra. Como também antecipou O GLOBO, o Planalto chegou a encomendar análises jurídicas para determinar se os planos de Guedes podem ser implementados sem ferir o Tratado de Assunção.
Dentro do Mercosul, o governo brasileiro tem o apoio do Uruguai, há anos defensor de uma abertura e da liberdade de negociar acordos individualmente. Na última cúpula de presidentes do bloco, em março, o presidente da Argentina disse a seu colega uruguaio, Luis Lacalle Pou, que, se não estiver satisfeito, que descesse do barco.
Na carta deste sábado, o petista e o tucano reafirmam que “é necessário manter a integridade do bloco, para que todos os seus membros desenvolvam plenamente suas capacidades industriais e tecnológicas e participem de modo dinâmico e criativo da economia mundial contemporânea”.
Leia na íntegra a nota de Lula e FHC em apoio ao presidente argentino Alberto Fernández:
“Concordamos com a posição do presidente da Argentina, Alberto Fernández, de que este não é o momento para reduções tarifárias unilaterais por parte do Mercosul, sem nenhum benefício em favor das exportações do bloco. Concordamos também que é necessário manter a integridade do bloco, para que todos os seus membros desenvolvam plenamente suas capacidades industriais e tecnológicas e participem de modo dinâmico e criativo da economia mundial contemporânea.”
O Globo