Bolsonaro tem febre e deve ficar ao menos mais uma semana internado em SP
Uma semana depois de passar por uma cirurgia, o presidente Jair Bolsonaro ainda segue com restrições para retomar a rotina de despachos.
A previsão de alta, inicialmente em dez dias, foi adiada nesta segunda-feira (4) após os médicos que cuidam de sua recuperação detectarem febre e um possível quadro infeccioso na noite de domingo (3).
Bolsonaro segue internado no hospital Albert Einstein, em São Paulo, e foi levado a uma unidade de cuidados semi-intensivos nesta segunda, cinco dias após ter obtido alta da UTI (unidade de terapia intensiva).
Segundo o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, o presidente não deixará mais a internação na quarta-feira (6), como era previsto inicialmente. Segundo ele, Bolsonaro deve permanecer internado até, pelo menos, a próxima segunda-feira (11).
“Se nós tivermos que, a partir de hoje, já contarmos um prazo, este prazo não será antes desses sete dias que é exatamente o tempo de ação do antibiótico para debelar eventual infecção que possa ser gerada”, disse.
Segundo boletim médico divulgado nesta segunda, o presidente teve febre na véspera e exames mostraram acúmulo de líquido na região onde estava colocada uma bolsa de colostomia e aumento na taxa de leucócitos, o que pode significar início de processo infeccioso.
“Apresentou, ontem à noite, elevação da temperatura (37,3 °C) e alteração de alguns exames laboratoriais. Foi iniciado antibioticoterapia de amplo espectro e realizados novos exames de imagem. Identificou-se uma coleção líquida ao lado do intestino na região da antiga colostomia. Foi submetido à punção guiada por ultrassonografia e permanece com dreno no local”, diz o boletim médico.
Ele foi submetido a uma cirurgia e reconstrução do trânsito intestinalna segunda (28) em decorrência de uma facada sofrida durante a campanha.
O boletim médico informou ainda que o presidente foi submetido “à punção guiada por ultrassonografia e permanece com dreno no local [onde houve acúmulo de água”.
Embora Bolsonaro tenha apresentado aumento de temperatura corporal no domingo, nesta segunda ele está sem dor, afebril e em jejum oral.
Ele permanece com a sonda nasogástrica colocada no sábado, quando ele teve náuseas e vômitos. Segundo os médicos, sua nutrição vem sendo feita exclusivamente de forma parental.
De acordo com o boletim, o presidente “já apresenta movimentos intestinais e teve dois episódios de evacuação. Segue realizando exercícios respiratórios e de fortalecimento muscular no quarto”.
No domingo, ele foi submetido a uma tomografia no abdômen que descartou complicações cirúrgicas. Como a Folha publicou, Bolsonaro teve uma paralisia no intestino, que provocou náuseas e vômitos neste sábado (2). Tecnicamente, a condição clínica é chamada de “íleo paralítico”.
A assessoria da Presidência havia informado se tratar de uma “reação normal e decorrente da retomada da função intestinal”, mas médicos ouvidos pela reportagem disseram que a situação poderia indicar uma piora no quadro clínico.
As visitas continuam restritas, por orientação da equipe, e apenas a primeira-dama Michelle e um de seus filhos, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), o acompanham.
O porta-voz informou ainda que não há previsão de compromissos oficiais para os próximos dois dias. Havia um planejamento inicial de que alguns ministros pudessem viajar a São Paulo para conversar pessoalmente com o presidente, o que foi adiado.
Bolsonaro se manteve afastado da Presidência apenas nas 48 horas que se seguiram ao procedimento médico, período em que assumiu o vice, general Hamilton Mourão.
Desde então, ele teve apenas um despacho presencial, com o subchefe de Assuntos Jurídicos, na quinta, e uma reunião por videoconferência, na sexta.
O porta-voz disse que mesmo com as dificuldades, não há uma previsão de que Mourão volte a ocupar a Presidência.
“Por enquanto não há esse estudo, naturalmente, se os médicos acharem indicado isso, com toda a transparência, far-se-á novamente um documento, pedindo-se por meio deste laudo médico que o presidente seja afastado por um tempo que seja adequado para essa recuperação”, disse.
Sem citar nomes, Rêgo Barros afirmou que outros filhos de Bolsonaro devem visitá-lo. Até o momento, dos cinco filhos, apenas o senador Flavio Bolsonaro (PSL-RJ) e a caçula Laura não vieram ao Einstein.
Questionado sobre se o estado de saúde do presidente é normal, o porta-voz respondeu que “é considerado dentro do esperado, diante do quadro clínico que se encontra uma vez que foi submetido a três cirurgias de grande porte em um período de quatro meses”.
Rêgo Barros disse ainda que Bolsonaro tem mantido seu estado de ânimo habitual.
“Hoje ele me deu uma continência indo fazer esse procedimento [punção]. Eu acho que isso já indica o estado de ânimo dele. Eu naturalmente fiz a minha continência de forma muito honrosa para um homem que está lutando por sua vida para dirigir o país”, disse.
O porta-voz disse não poder descartar uma nova cirurgia, mas afirmou que essa possibilidade não está ‘no foco’ da equipe médica neste momento.
Pela manhã, Bolsonaro foi às redes sociais para dizer que suas funções estavam voltando à normalidade. No Twitter, ele publicou ainda um vídeo que mostra suas pernas pedalando em uma máquina que simula uma bicicleta, usada para realização de fisioterapia.
“Após uma semana da terceira cirurgia, no espaço de menos de 6 meses, graças a Deus, funções voltando à normalidade e fisioterapia contínua nos fortalecendo para que possamos voltar o mais rápido possível às atividades rotineiras com plena força. Agradeço a todos pelo apoio!”, escreveu.
Embora o Palácio do Planalto tenha improvisado um gabinete ao lado do quarto do presidente para a realização de despachos, ele segue sem agenda e com restrições para falar.
Segundo os médicos, o excesso de conversas provoca acúmulo de gases no abdômen e prejudica o processo de cicatrização.
BOLETIM MÉDICO TRAZ ALENTO E ALERTA
O boletim médico traz uma boa notícia, o fato de o presidente já ter evacuado, o que mostra a retomada do trânsito intestinal após a cirurgia, mas traz uma outra que inspira cuidados: a infecção (abscesso) intra-abdominal, que necessitou de drenagem.
De acordo com cirurgiões especialistas no trato digestivo, provavelmente foi essa infecção a causa da paralisação do intestino delgado (íleo paralítico), ocorrida no sábado, conforme a Folharevelou. Essas situações podem ocorrer em até 10% das cirurgias iguais à que Bolsonaro foi submetido.
“Todo médico quer que nessas situações seja um íleo paralítico por manipulação cirúrgica, mas, nesse período do pós-cirúrgico, em geral, está relacionado a uma infecção”, explica Carlos Sobrado, professor de coloproctologia da Faculdade de Medicina da USP.
Segundo o cirurgião Diego Adão Fanti Silva, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), essas infecções relacionadas à cirurgia são o principal tipo de complicação pós-operatória. “Ao abrir o intestino e manipular, o risco é inerente. Mesmo com todo cuidado e uso de antibiótico profilático, pode acontecer”, explica.
O que precisa saber agora é se o abscesso está ou não relacionado a uma fístula (abertura da sutura), se ele vai se resolver apenas com o dreno e qual a bactéria envolvida na infecção. Amostras da secreção foram aspiradas e levadas para cultura para saber o nome da bactéria e o seu perfil de sensibilidade (qual antibiótico mata).
“A questão é saber o motivo dessa coleção [de bactérias], será que vazou um pouquinho [de conteúdo fecal na cavidade abdominal]?. Nas próximas 48 horas é que vamos ter certeza. Se não tiver mais febre, o PCR [proteína C reativa, que indicativo de infecção] baixar, ele se alimentar, evacuar, aí tudo bem”, diz Sobrado.
Com a punção e com o antibiótico de amplo espectro prescrito, espera-se uma boa resposta em 48 horas, no máximo . “Agora, se a febre voltar, pode ser sinal de fístula”, diz Sobrado.
Outra preocupação é com o tempo de nutrição parenteral (veia). “Quanto mais tempo, maior o risco de uma infecção por cateter por bactérias resistentes e fungos. Até uma semana após a cirurgia, o risco é pequeno. A partir de uma semana de acesso venoso central com dieta parenteral, o risco começa a ficar maior e só vai subindo”, explica Fanti Silva.
FOLHA