Desempregados tentam salvar o ano trabalhando pela 1ª vez de papai noel
Faxineiro, ajudante geral, segurança. Uma operadora de telemarketing. Um adepto do Hare Krishna. Entre eles, três coisas em comum: o desemprego, o gorrinho vermelho e o sonho de salvar o Natal sendo aprovado no curso gratuito de formação de papai noel e tentar fechar o ano com as contas “no azul”.
Ser papai noel em tempos de crise econômica não é tarefa fácil. Hipermercados, shoppings centers e lojas têm cortado custos e reduzido as vagas para o “bom velhinho” e suas companheiras, a mamãe noel e as noeletes.
O curso de papai noel é dado no Centro de São Paulo por Silvio Ribeiro, que trabalha como papai noel há 38 anos. Em 2014, ele tinha cerca de 30 vagas para oferecer. Neste ano, este número caiu pela metade. Mesmo assim, pouco mais de 20 pessoas apareceram para concorrer a um lugar no time natalino. “Como não tem muita probabilidade de trabalho nós não anunciamos”, disse Ribeiro.
‘Não tenho nada, a crise é pra quem tem alguma coisa’
O G1 acompanhou o curso na quinta-feira (19) e conversou com alguns dos candidatos. Entre eles havia um que não estava exatamente preocupado com a situação econômica e disse que procurou o curso porque as crianças sempre o chamavam de papai noel pela barba branca. “Eu não tenho nada. A crise é ruim para quem tem alguma coisa”, disse o adepto ao Hare Krishna Lionei Mangifesti, de 56 anos.
Ele mora em uma comunidade Hare Krishna em Mogi das Cruzes e disse que nunca mais aparou a barba ou cortou o cabelo desde que a mãe faleceu, em 2013, em homenagem a ela. De presente de Natal, ele responde: “Eu não quero para mim, eu quero para todos, a paz”.
‘Não tenho chances’
O faxineiro Mauro João da Silva, de 63 anos, está desempregado e também procura uma vaga de papai noel para ajudar na renda. Por não estar no estereótipo do personagem, ele acha difícil conseguir. “Não tenho chances. Não é racismo, mas papai noel é branco, né?”.
Papai noel tatuado
Jovem, tatuado e usando uma camisa de escola de samba, Otávio Felipe Dela Cruz, de 37 anos, tem um perfil bem diferente do imaginário do papai noel. Para conseguir um bico neste final de ano ele está num espírito “topa tudo”. “Até calcinha de mamãe noel eu tô topando”, brinca. E Otávio pareceu bem empenhado mesmo. Na hora do curso em que os alunos dançavam para se descontrair e soltar melhor o “hou hou hou”, ele arriscou até uma dança de cabeça para baixo.
Otávio é ajudante geral, está sem emprego há 4 meses e disse que já mandou mais de 100 currículos. Como presente do Papai Noel em dezembro, ele disse que gostaria de “trabalhar no final do ano e poder ajudar na ceia de Natal”.
‘Quero mesmo limpar meu nome’
A operadora de telemarketing Cláudia Regina e Silva, de 45 anos, está sem ocupação há sete meses e nunca tinha pensado em ser mamãe noel antes de ver o anúncio do curso. Quando perguntada sobre o motivo de tentar, responde: “porque estou gordinha e tenho mais de 45 anos”. Sobre o que gostaria de ganhar do bom velhinho no próximo Natal, ela diz: “Eu queria mesmo meu nome limpo para poder comprar a casa própria”.
Desempregado há sete meses, o segurança Marco Antônio Degani também tenta pela primeira vez trabalhar como papai noel “para entrar um dinheiro extra”. Com dois filhos, três enteados, e vários netos “emprestados”, como ele diz, se a oportunidade profissional não aparecer pelo menos o curso vai servir para que ele aprenda a se vestir para a ceia de Natal da família.
Hou hou hou exige ‘verdade’
Os alunos aprenderam como segurar um bebê, a origem de São Nicolau, o posicionamento certo do capuz e do cinto, além de receber dicas de como reagir a uma criança que xingue o papai noel. “A melhor política é a neutralidade, não pode responder”, disse Silvio.
O ponto alto do curso foi o momento de aprender o icônico “hou hou hou”. O professor explicou que cada “hou” é diferente do outro. “Tem que ter cadência, tem que ter verdade”. Para ajudar os alunos a se soltarem, ele dançaram ao som de “Stayng Alive”, da banda Bee Gees.
Outro conselho dado por Silvio é de que um papai noel profissional tem que “ser humilde, não pode ter vaidade”. Enquanto isso, cerca de uma hora do curso foi dedicada às fotos do professor com celebridades e gravações com equipes de televisão.