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Com recursos escassos, cubanos usam camisinhas infladas para pescar

16321156-300x208 Com recursos escassos, cubanos usam camisinhas infladas para pescar

Juan Luis Rosello ficou sentado por três horas no Malecón enquanto batia vento vindo do estreito da Flórida, empurrando as ondas com força contra aquela avenida à beira-mar de Havana.

Quando a noite caiu e o vento mudou de direção, Rosello, 47, retirou de sua mochila quatro camisinhas e começou a inflá-las. Quando os preservativos alcançaram o tamanho de bexigas, o funcionário de lanchonete as amarrou pelas pontas, as prendeu a uma linha de pesca com isca e as deixou flutuar pela maré até chegar ao fim de sua linha de 230 metros.

Ramon Espinosa – 13.nov.2016/Associated Press
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O mecânico Junior Torres Lopez se prepara para fazer “pesca com balão” em Havana

Após seis décadas de embargo dos Estados Unidos e de uma economia de planejamento centralizado inspirada na União Soviética, os cubanos se tornaram mestres em encontrar soluções engenhosas a partir de recursos extremamente limitados.

Poucas são tão criativas quanto aquela que os pescadores de Havana chamam de “pesca com balão”, uma técnica que emprega poucos centavos de camisinhas subsidiadas pelo regime para tirar do mar peixes que valem o equivalente ao salário de um mês.

Em qualquer noite em Havana, é possível encontrar dezenas de homens “pescando com balões” no calçadão, usando suas boias improvisadas para levar suas linhas até 300 metros nas águas costeiras, onde servem para manter a isca perto da superfície e para aumentar a resistência da linha contra puxões de peixes grandes.

“Ninguém consegue jogar a linha tão longe manualmente”, disse Ivan Muno, 56, que pescava ao lado de Rosello.

Rosello ficou sentado por mais quatro horas enquanto o mar escuro batia nas pedras abaixo da barreira costeira, com algas verdes reluzindo nas ondas sob uma enorme lua e os sons da cidade sendo abafados pelo vento e pela água. Por volta da meia-noite, ele foi para casa sem ter capturado nenhum peixe mas planejando voltar em breve.

“Este é o jeito mais eficiente de pescar”, disse Rosello. “Alguém teve esta grande ideia, e eu posso passar a noite inteira aqui com os balões soltos.”

Ramon Espinosa – 10.nov.2016/Associated Press
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Mergulhador retorna ao Malecón, em Havana, com peixe recém capturado

Cuba é conhecida por sua pesca ao menos desde os tempos do escritor americano Ernest Hemingway, que viveu no país entre as anos 1940 e 1950. Todos os anos, milhares de estrangeiros viajam à ilha para pescar em águas bastante preservadas devido ao subdesenvolvimento cubano.

Boa parte da costa de Cuba permanece livre das grandes construções que danificaram ecossistemas em outras partes do Caribe. A frota de pesca industrial da ilha foi devastada com a queda da União Soviética.

Para os cubanos, aproveitar um de seus maiores recursos continua um desafio. Para todos, com exceção dos mais ricos, até o menor barco e o combustível necessário para utilizá-lo são caros demais.

Muitos cubanos se aventuram em câmaras de ar ou blocos de espuma industrial para tentar pegar peixes grandes, mas essas perigosas técnicas se tornaram alvos frequentes de operações da guarda costeira e sujeitas a multas pesadas.

A pesca com balão é mais barata, menos arriscada e cada vez mais popular.

“Não faz sentido levar uma multa de 3.000 pesos (cerca de R$ 400) e ter seu equipamento confiscado”, disse Leandro Casas, um trabalhador autônomo da construção que pescava no Malecón.

Ramon Espinosa – 11.nov.2016/Associated Press
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Pescadores cubanos se preparam para pescar em Havana usando botes feitos com espuma

Não se sabe exatamente quando a técnica foi adotada, mas segundo reza a lenda entre os pescadores, o inventor da pesca com balão em Cuba assistiu a um vídeo de sul-africanos pescando com pipas e teve a ideia de utilizar camisinhas infladas.

Altamente subsidiadas, as camisinhas custam menos de um centavo, várias vezes mais baratas que bexigas de festa comuns.

É ilegal vender peixe em Cuba sem uma licença, e os pescadores que usam balões dizem que tentam apenas alimentar suas famílias. Muitos admitem, porém, que seria loucura fazer qualquer coisa senão vender um peixe de quase 15 quilos, que pode valer até R$ 100 em um país onde o salário médio pago pelo governo não passa de R$ 85.

Se a maioria dos cubanos não consegue comprar peixes, os restaurantes privados de Cuba, sua crescente classe média-alta e os milhares de estrangeiros que moram na capital são compradores ávidos.

Alex Romero, presidente há 42 anos da Velha Federação de Pescadores de Havana, apoiada pelo Estado, disse que os pescadores com balões são tão hábeis quanto qualquer um que pesque com linha e que estão ganhando experiência à medida que sua técnica ganha popularidade.

“É eficiente e todos a estão utilizando”, afirmou. “É a engenhosidade que os cubanos sempre mostram ao resolver problemas sem gastar muito dinheiro.”

O Pipoco

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