Brasil deve cumprir promessa e acolher sírios, diz chefe do Acnur
O alto comissário da ONU para refugiados, Filippo Grandi, reuniu-se com o presidente Michel Temer na segunda (19) e cobrou do Brasil a promessa de receber mais refugiados sírios.
“Quando o presidente Temer esteve em Nova York, em 2016, comprometeu-se a receber 3.000 sírios no Brasil”, disse Grandi, em entrevista à Folha, nesta quarta (21).
“Mas havia outras prioridades no Brasil, crise política, e o programa ficou em segundo plano. Precisamos implementá-lo. É um pedido que faço. Cumpram a promessa.”
O chefe da Agência da ONU para refugiados (Acnur) também frisou a necessidade de acelerar a concessão de refúgio a venezuelanos no Brasil.
Filippo Grandi – Os venezuelanos estão deixando seu país por diferentes razões. Alguns estão pedindo refúgio. Trata-se de uma decisão deles.
No Brasil, 24 mil pediram refúgio e, na região, 130 mil. Alguns são beneficiados por alternativas como autorização de residência do Mercosul.
O importante é garantir que as pessoas tenham proteção e sejam acolhidas. É claro que, para esses 24 mil que pediram refúgio, esperamos que o processo seja agilizado.
Segundo cálculos, o processamento de todos os pedidos de refúgio hoje no Conare [Comitê Nacional para os Refugiados] levaria mais de 20 anos…
Se os números continuarem substanciais, haverá necessidade de aumentar a capacidade do Conare. Eu me reuni com o ministro [da Justiça, Torquato] Jardim e falei sobre isso. É algo que precisa ser solucionado.
Temer disse que gostaria de ter apoio internacional para isso, e eu concordo totalmente, estamos buscando ajuda de outros governos.
Alguns venezuelanos vão querer voltar para suas casas, mas, para aqueles que querem ou precisam ficar aqui, é preciso integrá-los, e isso significa serviços, empregos, aceitação da comunidade local.
Quando vieram milhares de haitianos para o Brasil, em 2014 e 2015, o governo do Acre colocou os migrantes em ônibus e os despachou para outros Estados, sem nem avisar.
Sim, a primeira fase foi desorganizada. Na segunda, a interiorização foi muito bem-sucedida. Integração é um desafio. O clima político aqui ainda está favorável, mas sempre há pessoas que se opõem, se sentem ameaçadas, então é preciso sermos cautelosos.
O senhor elogiou a iniciativa do Brasil de conceder vistos humanitários para pessoas afetadas pela guerra da Síria.
Sim, é muito positiva. No entanto, o visto humanitário é um programa parcial. As pessoas precisam pagar por suas passagens aéreas.
Quando o presidente Temer esteve em Nova York, em 2016, comprometeu-se a receber 3.000 sírios no Brasil. É importante reassentar, porque manda um sinal positivo para países como Líbano e Jordânia, que abrigam milhões de refugiados.
Mas havia outras prioridades no Brasil, crise política, e o programa ficou em segundo plano. O objetivo da minha visita é incentivar o Brasil a retomá-lo. É um pedido que faço ao Brasil de forma enfática: por favor, cumpram a promessa.
O anúncio foi feito há dois anos. Eu disse ao ministro Jardim que precisamos acelerar. E, além disso, também há o comprometimento de receber gente da América Central. Eles costumavam ir para os EUA. Agora está mais difícil. Seria bom se alguns pudessem vir para cá.
O número de refugiados reassentados nos EUA caiu de 95 mil em 2016 para 29 mil em 2017. Quais são os efeitos?
Perdemos metade de nossas “vagas” globais para reassentamento. Não queremos substituir os EUA, queremos que eles voltem a reassentar mais. Mas, no momento, estamos desesperados, precisamos que mais países ajudem. Sei que o Brasil enfrenta desafios, mas o país tem ambições de ter um papel global.
FOLHA