Governo prepara medida que reduz fatia na Eletrobras para conter desgaste com Petrobras
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) deve enviar nas próximas semanas ao Poder Legislativo uma medida provisória para diminuir a participação da União na Eletrobras, empresa estatal de energia. A intenção com a iniciativa é tentar arrefecer o desgaste do governo provocado pela intervenção na Petrobras.
Na sexta-feira (19), como forma de agradar movimentos de caminhoneiros, o presidente indicou o general da reserva Joaquim Silva e Luna como novo presidente da petroleira. Se confirmado pelo conselho de administração da companhia, ele substituirá Roberto Castello Branco, que se tornou desafeto do Palácio do Planalto.
A medida provocou reação negativa do mercado financeiro, para o qual o governo federal rompeu com tendência liberal, e causou derretimento das ações da Petrobras. Na sexta-feira (19), a empresa já havia perdido R$ 28,2 bilhões em valor de mercado. Nesta segunda-feira (22), as ações caíam quase 20%.
Como forma de sinalizar que o Poder Executivo ainda mantém compromisso com a agenda liberal, o Palácio do Planalto elabora uma medida provisória que dilui a participação acionária da União e de outros braços do governo federal na estatal de energia. A iniciativa aguarda a chancela do Ministério da Economia, que analisa os termos da proposta.
Hoje, a União tem 42,57% das ações ordinárias (com direito a voto) da Eletrobras. O BNDES e o BNDESPar detêm 13,79%, e fundos de governo ficam com 2,97%. A proposta é fazer com que a empresa lance no mercado novas ações ordinárias, que não seriam compradas pela União.
Assim, o aumento do capital social da estatal elétrica diluiria a participação total do governo até uma fatia minoritária próxima de 45%. As medidas provisórias entram em vigor assim que são publicadas, mas precisam do aval da Câmara e do Senado em 120 dias. Caso contrário, perdem a validade.
Pelo acordo que está sendo costurado pelo Planalto com o Congresso, o BNDES estruturaria o modelo de venda da estatal durante a tramitação da medida provisória. Em outra frente, o tempo também é necessário para diminuir a resistência ao assunto, em especial no Senado.
Esse arranjo político só foi possível graças à promessa feita pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de que terá o apoio da nova base aliada para que a capitalização da Eletrobras prospere por medida provisória.
Assessores da companhia envolvidos nas negociações afirmam que, até hoje, o governo não conseguiu avançar com a venda do controle da estatal porque o ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), queria conduzir o processo por meio de projeto de lei.
A negociação em curso inclui ainda a condição de que a capitalização só aconteça após a conversão da medida provisória em lei, para evitar desconforto com o Legislativo.
O texto em construção também contempla a possibilidade de que a União tenha uma golden share, ação especial que garante poder de veto mesmo se ela tiver participação minoritária na empresa.
O instrumento é visto com ressalvas por investidores, pelo poder que confere à União. A minuta da medida provisória em fase de finalização no Ministério da Economia não contempla a venda de ativos da elétrica.
A privatização da Eletrobras foi uma das prioridades elencadas por Bolsonaro aos novos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), no início de fevereiro.
A dificuldade de aprovar a venda da estatal foi um dos motivos que levaram à saída de Wilson Ferreira Junior da presidência da Eletrobras, no final de janeiro. Ao anunciar que deixaria o cargo, ele afirmou que a privatização da empresa é prioridade do governo federal, mas que essa vontade não é suficiente sem o apoio do Congresso.
O Poder Executivo enviou, em novembro de 2019, um projeto de lei para viabilizar a privatização da empresa, que começou a tramitar – e travou – na Câmara. Pela proposta, seriam emitidas novas ações da estatal para diluir a participação da União, que também venderia papéis que tem na Eletrobras.
O governo federal, porém, jogou a toalha depois de o então presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), afirmar que, mesmo que passasse na Câmara, a iniciativa dificilmente seria chancelada pelos senadores. Na Casa, a resistência continua sendo muito grande, em especial entre congressistas do Norte e do Nordeste.
A edição da medida provisória para diluir a participação da União na Eletrobras foi resgatada neste momento como um aceno tanto ao mercado financeiro como o ministro da Economia, Paulo Guedes, que foi contrário a uma intervenção do comando da Petrobras.
Desde o final de semana, Bolsonaro tem feito acenos ao ministro, que não foi consultado sobre a decisão do presidente de intervir na empresa petrolífera.
Segundo assessores presidenciais, Bolsonaro telefonou no final de semana a Guedes e promoverá uma cerimônia na quarta-feira (24) para sancionar proposta de independência do Banco Central, pauta que agrada Guedes.
O presidente também se comprometeu a não fazer, neste momento, mudança no comando do Banco do Brasil. Desde janeiro, Bolsonaro discute a saída de André Brandão. O presidente se irritou com o plano de demissão voluntária aberto pela instituição financeira.
Na época, ele foi convencido a suspender a demissão a pedido de Guedes e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Segundo relatos feitos à reportagem, porém, ele voltou a cogitar uma troca.
A fritura de Brandão passou a ganhar força após deputados do centrão terem defendido a necessidade de o Banco do Brasil ser administrado por um nome afinado a Bolsonaro, assim como é Pedro Guimarães, que comanda a Caixa. Eles criticam também o plano de fechamento de 361 agências anunciado pelo Banco do Brasil.
O Banco do Brasil é uma sociedade aberta, cujo preço das ações pode sofrer queda diante de interferências do poder público. O cálculo feito por integrantes do governo é que a nomeação de um indicado pelo centrão possa evitar uma troca ministerial para acomodar uma das siglas da base.
A reação negativa da intervenção na Petrobras, contudo, deu nova sobrevida a Brandão, já que uma saída agora poderia tanto aumentar a desconfiança do mercado financeiro em relação a Bolsonaro como agravar o desgaste de Guedes.
FOLHAPRESS