Estudo aponta diferentes respostas protetoras após vacina e cura da Covid
Pessoas que tiveram infecção pelo coronavírus no passado podem produzir uma resposta imune mais diversificada, mas a ação de neutralização nos vacinados que não tiveram contato prévio com o vírus é dada até 12 vezes mais pela vacina.
Os resultados da pesquisa, conduzida por cientistas da Universidade Rockfeller (EUA) e coordenada pelo imunologista brasileiro Michel Nussenzweig, foram divulgados na prestigiosa revista científica Nature no último dia 7.
A proteção conferida por uma infecção prévia ao Sars-CoV-2 pode se desenvolver e ser até bem robusta nas pessoas, mas ainda não é possível afirmar com certeza que todos os indivíduos que tiveram Covid no passado vão conseguir se defender frente a uma nova infecção.
Já a imunidade conferida por vacinas pode oferecer uma arma imunológica imediata, mas a duração dessa resposta imune ainda está sendo melhor estabelecida conforme os estudos sobre a necessidade de doses de reforço avançam.
Os pesquisadores procuraram avaliar então qual seria a proteção conferida entre as duas doses (D1 e D2) e 1,3 e cinco meses após a D2 das vacinas contra Covid de mRNA em pessoas que nunca se infectaram — os chamados “naives” — e comparar a taxa de anticorpos e tipos de células de defesa no organismo com o observado em recuperados.
Foram avaliadas amostras de sangue de 32 pessoas que não tinham histórico de Covid (oito vacinados com a vacina da Moderna e 24 com a Pfizer/BioNTech) em três momentos distintos: “prime” (até duas semanas e meia após a primeira dose e antes da segunda), 1,3 mês após a segunda dose (equivalente ao grupo controle, que incluiu sangue de pessoas recuperadas de Covid 1,3 mês após a infecção) e cinco meses após a segunda dose.
Do total de amostras, 53% foram de homens e 47% mulheres, e a idade média dos indivíduos analisados foi 34,5 anos (os participantes tinham de 23 a 78 anos).
O que os cientistas observaram foi que, apesar de a resposta imune após a infecção natural ser mais diversificada, podendo evoluir inclusive para combater às novas variantes, o potencial de neutralização do vírus pelas vacinas é maior do que com a imunidade natural.
Nas primeiras semanas após a primeira dose, a taxa de anticorpos dos tipos IgG, IgA e IgM no sangue aumenta, embora as imunoglobulinas do tipo IgG fossem predominantes em relação às outras duas (e são os anticorpos associados à resposta imune de memória).
Após 1,3 mês da segunda dose, a taxa de anticorpos no sangue era maior nos vacinados em comparação aos chamados convalescentes.
Porém, a mesma avaliação cinco meses após a segunda dose encontrou uma redução significativa nas taxas de anticorpos IgA e IgM, o que era esperado, uma vez que esses anticorpos não permanecem em circulação por um longo período no corpo – o que se deseja com uma indução de resposta imune é gerar a capacidade de reconhecer rapidamente o antígeno e neutralizá-lo quando frente a uma infecção natural.
Já quando avaliados os anticorpos do tipo neutralizantes, capazes de reconhecer uma parte específica do vírus (nesse caso, a região de domínio de ligação, ou RBD) e bloquear sua entrada nas células, após a segunda dose da vacina a quantidade dessas moléculas era 12 vezes maior do que no início do experimento e até cinco vezes mais quando comparado aos convalescentes.
Isso demonstra a capacidade protetora das vacinas e sua importância para gerar uma resposta imune em indivíduos que não tiveram infecção prévia pelo vírus, e um potencial elevado no combate ao vírus caso um contato natural venha a acontecer no futuro.
No entanto, a produção de células do tipo B de memória, produtoras de anticorpos, pode ajudar as pessoas que já tiveram Covid no passado a combater melhor novas variantes do vírus, indica o estudo.
Isso porque essas células eram mais diversificadas e produziram anticorpos capazes de atacar as variantes testadas — alfa, beta, gama, delta e iota — em níveis ligeiramente maiores do que a vacinação, que também conseguiu bloqueá-las, mas com redução significativa de anticorpos.
Nos vacinados, a diversificação dessas células de memória ocorreu até cinco meses após a segunda dose, mas não foram observadas modificações após esse período. Já no intervalo entre a primeira e a segunda dose e logo após a segunda dose, as células B de memória nos indivíduos vacinados foram responsáveis pela formação dos anticorpos neutralizantes.
Esse achado pode indicar que pessoas com infecção prévia ao Sars-CoV-2 podem necessitar de menos doses de imunizantes do que aquelas que são “naive”, uma vez que a proteção dada por uma resposta imune de memória somada à dada pela vacinação pode ser mais robusta.
Em contrapartida, pessoas que não se infectaram, quando recebem as duas doses das vacinas de mRNA, produzem uma resposta significativa de neutralização do vírus e produção de anticorpos. Algumas variantes de preocupação, no entanto, podem conseguir escapar da proteção conferida, sugerindo a necessidade de doses adicionais ao longo do tempo.
“Indivíduos convalescentes desenvolvem aumento na potência e ação de células de memória contra o vírus original de Wuhan e suas cepas após um reforço da vacina. Já os vacinados também produzem níveis elevados de anticorpos neutralizantes quando recebem doses de reforço. Dada a emergência atual de novas variantes do Sars-CoV-2, doses de reforço para prevenir a infecção podem ser necessárias, (…) e o momento certo do reforço vai depender na estabilidade e evolução das células B de memória [nesses indivíduos]”, concluem os autores.
FOLHAPRESS