Governo tenta remanejar R$ 130 milhões para trocar cartões do Auxílio Brasil
A menos de cinco meses das eleições, o governo Jair Bolsonaro (PL) discute como obter recursos para os novos cartões do Auxílio Brasil. A maioria dos 18 milhões de beneficiários do programa social, considerado o carro-chefe da campanha à reeleição, recebe o dinheiro por meio de modelos com a marca do Bolsa Família, associado ao PT.
A busca por recursos para os cartões é priorizada enquanto há relatos de fila de espera no programa. De acordo com estudo da CNM (Confederação Nacional dos Municípios), mais de 1 milhão de famílias aguardam para entrar no Auxílio Brasil.
A emissão dos cartões é vista pelo governo como estratégica para reforçar a marca do novo programa entre as famílias. A campanha de Bolsonaro identificou que muitas ainda sacam os recursos com o antigo cartão, dificultando a associação dos pagamentos ao atual presidente. Além disso, novos beneficiários ainda não receberam o seu exemplar.
Um impasse entre o Ministério da Cidadania e a Caixa Econômica Federal tem dificultado a mudança. Inicialmente, a pasta responsável pelo programa tentou fazer com que o banco, que opera os pagamentos, emitisse os novos cartões por conta própria, em consideração aos contratos que o governo já tem com a instituição.
A Caixa, porém, apontou problemas técnicos para isso e cobra cerca de R$ 18 por cartão emitido.
O Ministério da Cidadania pediu recursos à Economia. O pedido foi levado à Secretaria de Orçamento Federal, que o apresentou à JEO (Junta de Execução Orçamentária, formada por Economia e Casa Civil). Mas, como não havia espaço no teto de gastos, regra que limita as despesas do governo, a Cidadania optou por buscar dinheiro dentro do próprio orçamento.
A pasta agora tenta remanejar recursos internos para custear o novo modelo. No final da semana passada, o secretário Nacional de Renda de Cidadania, Átila Brandão Junior, enviou um novo ofício ao Ministério da Economia questionando a possibilidade de remanejamento.
No documento, obtido pela reportagem, o secretário pergunta se é possível usar R$ 130 milhões de uma rubrica originalmente destinada a “processamento de dados, de informações e de outras atividades necessárias para a operacionalização dos benefícios”. A verba seria suficiente para custear a emissão de cerca de 7,14 milhões de cartões com chip para beneficiários do programa.
Isso significa que mais da metade das famílias contempladas pelo programa, criado por Bolsonaro para ser a marca social de seu governo, pode chegar a outubro, mês das eleições, com o cartão do programa criado pelo principal adversário, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Originalmente, o contrato do governo com a Caixa para operar o Auxílio Brasil -incluindo a emissão de cartões- é bancado com recursos de outra ação, designada “Encargos Financeiros da União”.
O banco também tem sinalizado nas negociações que o valor cobrado para cada nova emissão, já considerado alto pelo ministério, poderia ser ainda maior para os demais, a depender do modelo escolhido. Interlocutores no governo dizem haver ainda uma grande dificuldade de encontrar recursos para pagar a emissão dos demais cartões.
Mais ainda, veem um empecilho no prazo: mesmo que se consigam os recursos, eles teriam recebido sinalizações da Caixa de que seria difícil fabricar todos os demais milhões de cartões em tempo hábil.
A principal justificativa técnica do governo para trocar os cartões é para que tenham chip e senha. A mudança, segundo esses interlocutores, incluiria os beneficiários no sistema bancário, uma vez que poderiam, por exemplo, usar o cartão em um mercado em vez de serem limitados a sacar o dinheiro.
Na criação do Auxílio Brasil, em 2021, os beneficiários já passaram a ter mais escolhas ao poderem movimentar os recursos por meio do aplicativo Caixa Tem -inclusive com disponibilidade de transferências e pagamentos via Pix.
Procurada, a Caixa afirmou em nota que, em relação à emissão dos cartões, “o Ministério da Cidadania está em tratativas com o banco sobre o assunto”. A pasta não respondeu ao pedido de comentário.
Em um momento de elevada taxa de reprovação de Bolsonaro entre as pessoas que recebem o Auxílio Brasil, o novo cartão é considerado um possível trunfo para o presidente melhorar sua imagem. O diagnóstico levou o núcleo de campanha a estabelecer medidas focadas no grupo de beneficiários como prioridade para reverter os números ruins.
Como o jornal Folha de S.Paulo mostrou, a campanha de Bolsonaro traçou como estratégia intensificar a marca do programa em inserções na televisão e em outdoors nas regiões mais críticas.
Aliados de Bolsonaro identificaram que, no Nordeste e em Minas Gerais, principalmente, a marca do Bolsa Família ainda é muito forte.
Além disso, integrantes do PL afirmam que pesquisas encomendadas pelo partido também mostram que uma faixa dos que recebem o benefício não atrela o pagamento dos R$ 400 ao governo federal, mas sim a gestões estaduais e municipais.
Envolvidos na campanha bolsonarista dizem ainda haver uma parcela de beneficiários que percebeu redução nos valores pagos pelo governo, que chegaram a R$ 600 na época do auxílio emergencial.
Outra medida importante para essa parcela do eleitorado que está parada e preocupa aliados do presidente é a MP (medida provisória) para permitir a contratação de empréstimos consignados por beneficiários do Auxílio Brasil e do BPC (Benefício de Prestação Continuada).
A MP foi publicada no Diário Oficial da União em 18 de março. Em tese, já poderia estar valendo, mas precisaria de uma portaria com regulamentação -o que, até o momento, não ocorreu.
Integrantes do governo creditam também ao impasse entre Cidadania e Caixa a lentidão em pôr em andamento esta medida.
FOLHAPRESS