Doleiro diz que Cunha foi destinatário de transferências de US$ 5 milhões
O doleiro Leonardo Meirelles, ex-sócio de Alberto Youssef, disse, em depoimento ao Conselho de Ética da Câmara nesta quinta-feira (7), que o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) foi o destinatário de transferências no valor de US$ 5 milhões.
“[Alberto] Youssef me colocou de forma informal, num almoço, que esses valores eram para entrega de Eduardo Cunha”, disse Meirelles ao ser questionado sobre quem teria recebido o montante transferido em 2012.
O doleiro deixou claro, contudo, não ter documentos que comprovem a destinação dos US$ 5 milhões para Cunha, já que a informação lhe foi passada de maneira “informal”.
Segundo Meirelles, em abril de 2012, Youssef o chamou em seu escritório para dizer que teria uma transferência em “montante significativamente maior”, em torno de US$ 5 milhões, e que haveria a necessidade de formular um “contrato de prestação de serviços junto a uma empresa no exterior”.
O contrato foi assinado em maio de 2012 com a empresa de Meirelles, a RFY Import and Export Ltd., na China.
Foram feitas então três transferências, em junho (US$ 2,3 milhões), outubro (US$ 2,3 milhões) e novembro de 2012 (US$ 400 mil) –no valor de total de US$ 5 milhões– de uma empresa do lobista Julio Camargo, também alvo da operação Lava Jato, para contas da empresa RFY, de Meirelles, em dois bancos em Hong Kong.
Os valores foram então repassados, já em reais e em espécie, por Meirelles para Youssef. “[Na época] Alberto Youssef não colocava diretamente quem era o destinatário (…) O Youssef só me passava valores”, disse.
O almoço em que Youssef teria citado Cunha como destinatário ocorreu dias após a entrega do dinheiro por Meirelles. O doleiro disse ainda ter visto Julio Camargo saindo do escritório de Youssef no mesmo dia do almoço. “Ele [Youssef] me disse: ‘Você nem imagina a pressão que eu estava sofrendo’. E disse que era de Eduardo Cunha”, afirmou Meirelles.
O doleiro fechou um acordo de delação premiada com a PGR (Procuradoria-Geral da República) e disse ter ido à China e trazido uma “farta documentação” –entre elas os comprovantes das transferências–, já entregue os para a Polícia Federal e a PGR.
“Já entreguei mais de 400, 500 swifts [comprovantes de transferências internacionais] de minha empresa no exterior”, disse.
Meirelles contestou a informação, publicada pela Folha, de que os US$ 5 milhões que saíram dos bancos na China foram depositados em contas na Suíça que seriam de Eduardo Cunha.
“[Confirmo] da conta da China; da transferência para a Suíça, não. A Folha de S. Paulo reproduziu de forma errada”, disse. “Não repaguei para contas na Suíça, não tenho conhecimento de contas na Suíça de Eduardo Cunha.”
A informação sobre a transferência da China para a Suíça foi dada à Folhapelo próprio advogado de Meirelles, Haroldo Nater.
O advogado de Cunha, Marcelo Nobre, fez apenas duas perguntas a Meirelles: se ele sabia se Cunha mentiu à CPI e se conhecia alguma “falsidade ou omissão” na declaração de renda do presidente da Câmara. A resposta do doleiro às duas foi: “Não sei responder”.
O Conselho de Ética analisa o pedido de cassação de Cunha por quebra de decoro. Ele é suspeito de manter contas bancárias secretas no exterior e de ter mentido sobre a existência delas ao depor à CPI da Petrobras.
APOIO A CUNHA
Após responder às perguntas do relator, Marcos Rogério (DEM-RO), e de Nobre, Meirelles foi questionado pelos deputados aliados a Cunha sobre a falta de documentos que comprovem o presidente da Câmara como destinatário.
Antes do início da fala de Meirelles, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) e o advogado Marcelo Nobre questionaram a presença do doleiro.
“Se ele não trouxer prova de que o presidente Eduardo Cunha tem contas na Suíça, estamos sendo vítimas de um ato de pirotecnia contra o impeachment [da presidente Dilma Rousseff”, disse Marun. A defesa de Cunha chegou a acionar o STF (Supremo Tribunal Federal) para cancelar o depoimento de Meirelles.
Houve ainda um princípio de tumulto quando o advogado do doleiro, Haroldo César, disse que ele não assinaria o termo de compromisso. Deputados contestaram e Meirelles mudou de ideia, assinando o termo.
PASSAGENS
O presidente do conselho, José Carlos de Araújo (PR-BA), criticou Cunha por não ter aprovado a concessão de passagem e hospedagem para que o doleiro viesse testemunhar com seu advogado. O próprio Meirelles pagou por sua viagem de São Paulo a Brasília.
“Até hoje a presidência [da Casa] não respondeu o pedido [de passagens] feito em 31 de março. É um caso inédito: sou presidente desse conselho pela terceira vez e nunca um pedido de logística deixou de ser respondido”, afirmou Araújo.
“O presidente Eduardo Cunha acaba de demonstrar que é um grande chantagista”, disse o deputado Zé Geraldo (PT-PA).
O advogado de Cunha, porém, afirmou que Meirelles pagou as passagens porque “tem interesse”. “Pagar para vir aqui [depor]? Nunca vi isso.”
Condenado a cinco anos e seis meses de prisão e réu em outras duas ações, Meirelles vai cumprir a pena em regime aberto graças à delação e pagará multa de R$ 350 mil.
O doleiro foi convidado para falar como testemunha pelo PSOL e pela Rede, autores da representação contra Cunha.